Um rio de contas e tradições!

publicado por Tiago dos Reis em 14 de setembro de 2011
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Esse post pertence à série “Outras Rotas” do “Rotas”. Nela, os nossos blogueiros fazem relatos de suas viagens fora do Espírito Santo. Se quiser conhecer mais sobre esses relatos, basta clicar na aba “Outras Rotas” ali no topo do site para ter acesso a todos os posts separados por destino.

Já estou quase de partida para novas aventuras em Outras Rotas e ainda nem terminei o relato da nossa viagem à Chapada Diamantina. Pois bem! Cumpro meu ofício com esse último post.

Nossa viagem à Chapada Diamantina chegou ao fim na cidadezinha de Rio de Contas, no extremo sul do Parque Nacional.

A bem da verdade, Rio de Contas não pertence ao roteiro oficial de viagens à Chapada Diamantina. Pode-se muito bem conhecer a Chapada sem ao menos ouvir falar de Rio de Contas. Eu mesmo só fiz questão de incluí-la em nossos planos de viagem depois de descobrir que Rio de Contas ostenta um belíssimo conjunto de casarios coloniais do século XVIII.

O cenário de igrejinhas antigas, praças, casinhas de adobe e ruas de pedra é quase um imã pra mim. Eu me fascino pela herança arquitetônica do nosso Brasil colônia e fico absolutamente entusiasmado de visitar lugares históricos nas minhas viagens. Foi por isso que eu decidi incluir Rio de Contas no nosso roteiro.

Alguma coisa me dizia que eu ia adorar Rio de Contas.

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E, de fato, eu adorei Rio de Contas!

Mas, pra falar a verdade, eu tinha tudo para odiar Rio de Contas. É que a nossa passagem pela cidade foi um tanto quanto turbulenta e nos trouxe algumas dores de cabeça.

Em primeiro lugar, chegar até lá não foi nada fácil. De Mucugê a Jussiape, nós passamos por uma estrada tão alucinante quanto sinistra. O “alucinante” fica por conta da paisagem que, como quase tudo na Chapada, impressiona; o “sinistra” vai para os buracos, obstáculos e pouquíssimo movimento que tornam a viagem um pouco tensa. A sensação é que se está indo do nada para o lugar nenhum pelo pior caminho possível! Meu carro tem seqüelas adquiridas nesse trajeto que duram até hoje! No total, levamos quase 6 horas para chegar a Rio de Contas.

Por outro lado, a infra-estrutura turística da cidade é bem incipiente. A pousada mais bem recomendada de lá – a Raposo – foi uma verdadeira decepção. As instalações eram antigas e mal-cuidadas. Havia vários sinais de desgaste no nosso quarto: desde o colchão, que era bem desconfortável, até as toalhas de banho, que – acreditem! – estavam rasgadas.

E como se isso não bastasse, perdemos algumas horas da nossa rápida permanência na cidade dentro de uma oficina mecânica. Primeiro para desempenar o protetor do cárter do meu carro que não parava de trepidar após quicar em mil e um buracos. E, depois, para desempenar uma roda que não resistiu ao impacto de um buraco.

Tá certo que essa nossa visita a Rio de Contas poderia ter sido bem menos movimentada. Por conta desses percalços nós não pudemos conhecer todas as atrações que havíamos selecionado na cidade. Os povoados de Mato Grosso, Bananal e Barra, por exemplo, ficarão para uma próxima visita.

Mas, apesar de todos esses pesares, eu insisto em afirmar que eu adorei Rio de Contas! E não tinha como ser diferente. Além de se encaixar perfeitamente nas minhas preferências turístico-arquitetônicas, Rio de Contas nos surpreendeu com um outro grande tesouro: um artesanato riquíssimo!

O artesanato de Rio de Contas é um dos mais ricos e bonitos da Bahia. Quem me disse isso foi o Alcino, lá de Lençóis, que eu te apresentei aqui. São vários tipos de trabalhos manuais que vem passando de geração em geração desde a fundação da cidade no século XVIII.

O mais famoso deles é o crivo rústico, uma espécie de bordado feito em tecido de algodão cru ou alvejado que é exclusivo de Rio de Contas. Quem vê os produtos expostos na loja da Cooperativa de Artesãos da cidade nem imagina quão delicado e minucioso é o trabalho das bordadeiras: com a ponta de uma agulha elas desfiam cuidadosamente o pano, mantendo a mesma dimensão e distância entre as linhas; em seguida, elas retiram alguns fios para deixar pequenos buracos de acordo com o desenho a ser criado; e só então o processo do bordado começa com o emprego dos mais variados tipos de pontos.

O resultado final é esse:

A Renata ficou encantada com o trabalho das bordadeiras de Rio de Contas. Imediatamente ela teve a idéia de fazer dos paninhos de prato um autêntico souvenir da Chapada Diamantina e presentear todo mundo da família com um deles.

Quer dizer… todo mundo, não! Só as mulheres. Para os homens eu insisti em levar as cachaças orgânicas produzidas pela Fazenda Vaccaro, de Rio de Contas:

Fala que não é um souvenir muito mais interessante que um ímã de geladeira ou um chaveirinho qualquer?

Reza a lenda que o crivo rústico surgiu em Portugal e foi trazido, na época da colonização, pelas mulheres dos colonos que chegaram à cidade em busca de oportunidades. Hoje o bordado sobrevive graças ao trabalho das mulheres quilombolas que residem nos povoados da Barra e Bananal.

Sim, você leu certo. Rio de Contas tem duas comunidades remanescentes de quilombos. Aliás, Rio de Contas tem três comunidades étnicas que vivem em isolamento. Barra e Bananal, de origem quilombola, formada predominantemente por descendentes de escravos; e Mato Grosso, composta apenas por brancos descendentes de portugueses. O mais curioso de tudo é que, entre elas, não há miscigenação.

Mas o artesanato e as comunidades étnicas não são os únicos resquícios dos tempos da colonização. Na verdade, toda a cidade de Rio de Contas é uma herança desses tempos.

Ela é uma espécie de Ouro Preto do sertão baiano, se é que você me entende. São quase 300 casarios coloniais tombados pelo patrimônio histórico e artístico nacional. No meio deles, destacam-se os prédios do Paço Municipal, da antiga Casa de Câmara e Cadeia (atual Fórum), da Casa de Fundição, da Igreja do Santíssimo Sacramento, a de Nossa Senhora de Santana e do Teatro São Carlos, o único construído em toda a região da Chapada. Tudo isso recortado por ruas surpreendentemente largas e ladrilhadas.

A semelhança entre Rio de Contas e Ouro Preto não está apenas no cenário urbano. Está também na origem do seu desenvolvimento econômico. Rio de Contas se desenvolveu a partir da extração do ouro. E é por isso que se fala que, ali, em Rio de Contas, a Chapada nasceu Aurífera, e não Diamantina.

Minerais à parte, a Chapada em Rio de Contas também guarda belos atrativos naturais, como cachoeiras e trilhas. Uma das mais famosas é a que leva até o topo do Pico do Barbado, o ponto mais alto do Nordeste. E, por falar em altura, o segundo e o terceiro maior pico da Bahia também estão nos arredores de Rio de Contas: o do Itobira e o das Almas, respectivamente.

Pena que, para nós, Rio de Contas tenha sido a porta de saída da Chapada Diamantina. Após 10 dias de passeios, já não havia gás e tempo suficientes para outras aventuras!

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Comentários

  1. 15 set 2011

    Menino, tb gostei de Rio das Contas. Aliás, percebi o quanto sou uma pessoa influenciável durante a leitura da série Chapada… tudo que vc gostou, eu gostei tb; tudo o que vc não gostou, tb não achei legal….rsrsrsrs
    Agora, a pergunta que não quer calar: Renata, vc lembrou de mim nessa farra das toalhas???? Tiago, vc lembrou do Pedro nessa farra das cachaças???
    😉

    Beijinhos…

    • 11 out 2011

      kkkkkkkkkkkk
      Pô, Karol, você sabe, né? A família é grande e o dinheiro é curto! Mas os amigos sempre são lembrados!
      Bjão

  2. 02 out 2011

    Eu também chacoalhei nas estradas poeirentas até Rio de Contas. E também amei o lugar.
    Não comprei toalhas, nem pingas. Também não fui ao Pico das Almas como tinha planejado. Mas gostei muito da Ouro Preto baiana.

  3. Lídia
    30 dez 2011

    Deve ser um lugar surpreendente!! Amei os artesanatos…boas escolhas da Renata.

  4. Esperanza Oyarzabal
    30 mar 2012

    Adorei todos os artesanatos e bordados sao lindos . Entra no meu site para ver muitos bordados e se voce quiser e so clikar e imprimir tudo nao e dificil de fazer.abrazos Espe

  5. Thais
    10 set 2012

    Olá, vou para a Chapada e queria muito conhecer Rio de Contas, mas não queria pernoitar lá. Você indica conhecê-lo fazendo um passeio partindo de Mucugê?
    Obrigada!

    • 10 set 2012

      Oi, Thais, acho um pouco puxado. Tudo depende do quanto vc quer conhecer Rio de Contas. Você não vai gastar menos de 3 horas para ir e 3 horas para voltar (a estradinha de chão até Jussiape é terrível!!!! não passe por ela à noite de forma alguma). Para um passeio meramente contemplativo, pode ser possível conhecer Rio de Contas em poucas horas. Mas vai ser bem cansativo.

  6. JOSEMI ALVES DE OLIVEIRA
    11 dez 2013

    Prezados,

    Estou planejando viagem para Rio de Contas e já fiz a minha navegação sem precisar pasar por Jussiape, é só continuar na BA-142, passa pelo entrocamento de Ibicoara, Barra da Estiva até chegar na BA-262,após de Anagé, com destino a Brumado e aí é só alegria. Daí para Livramento de Nossa Senhora, subindo a serra e mais 20Km para Rio de Contas. Tudo no asfalto.

    Aproveitem,

    Josemi

    • 03 jan 2014

      Oi, Josemi. Essa é uma boa opção mesmo, apesar de aumentar muuuuito a distância. Eu acabei optando pela suposta rapidez do caminho e me dei mal.
      De qualquer forma, hoje eu faria esse caminha que você sugeriu. Até porque, na época em que fui, a BA 262 estava um tapete porque o asfalto tinha acabado de ser recapeado.

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