Quero morar em Mucugê!
Esse post pertence à série “Outras Rotas” do “Rotas”. Nela, os nossos blogueiros fazem relatos de suas viagens fora do Espírito Santo. Se quiser conhecer mais sobre esses relatos, basta clicar na aba “Outras Rotas” ali no topo do site para ter acesso a todos os posts separados por destino.
Lençóis é, sem dúvida alguma, a cidade mais famosa e com maior infra-estrutura para receber os turistas que querem conhecer a Chapada Diamantina. Mas foi a cidadezinha de Mucugê, a 130 km de Lençóis, que mais nos encantou!
Parece um contrassenso mas, embora Mucugê seja o município com o menor número de atrações “imperdíveis” da Chapada, ele é a melhor opção de estada para quem quer conhecer os atrativos “imperdíveis” da parte sul do Parque Nacional, como a Cachoeira do Buracão, a vila de Xique-Xique do Igatu e os poços Encantado e Azul. Isso porque a cidadezinha guarda o mesmo charme arquitetônico de Lençóis – diferentemente de Ibicoara e Andaraí, “donas” das atrações – e uma infra-estrutura de serviços turísticos satisfatória e ainda pouco afetada pelos efeitos do turismo predatório que já chegou à “capital” Lençóis (leia-se: CVC).
Mucugê está bem no meio do Parque Nacional da Chapada Diamantina, incrustada num vale rodeado por montanhas. Situada a uma altitude de 900 m, a cidade é uma das mais frias da região, com temperaturas médias que podem chegar a 7°C no inverno.
Além de todos aqueles atrativos naturais “imperdíveis” que podem ser visitados a alguns quilômetros de Mucugê, a cidade, por si só, é uma atração à parte. Fundada no final do século XVIII, no auge da exploração do diamante, ela ainda guarda boa parte dos casarios antigos construídos naquela época e preserva um belíssimo conjunto arquitetônico colonial.
Tal qual Ouro Preto, Tiradentes, Diamantina e Lençóis, passear por Mucugê também é uma experiência de retorno ao passado. É impossível não se imaginar ainda nos tempos do garimpo ao andar por sobre aquelas ruazinhas de pedra!
Além disso, no mês de junho – período em que estivemos lá – a cidade se enfeita para as festividades de São João, cobrindo suas ruas de bandeirolas. Dizem que o São João de Mucugê, assim como o de outras cidades da Chapada, é um dos mais famosos da Bahia.
Por sorte, tive o privilégio de acompanhar o ensaio da Orquestra Filarmônica de Mucugê em um finalzinho de tarde – sim, a cidade tem uma Orquestra Filarmônica centenária, composta por membros da própria comunidade. Eu estava na Pousada ´tentando´ descansar após o retorno de um passeio (ainda vou falar sobre o único ponto negativo da nossa estada em Mucugê: a Pousada), quando fui atraído por um som de marchinha que parecia tocar na pracinha do final da rua. Não pensei duas vezes: fui seguindo o rastro daquele som só para ver de onde ele saía.
Foi aí que eu descobri a existência da tal Filarmônica.
Fiquei alguns minutos na janela espreitando o ensaio. Ao me ver tirando fotos discretamente, o maestro me convidou para entrar e me deixou à vontade para fotografar. Não resisti! Fiquei mais algum tempo por ali fotografando, gravando e apreciando um pouco do que será apresentado na festa de São João.
Você também pode apreciar a música da Orquestra com esse pequeno vídeo que eu gravei lá:
[youtube=http://www.youtube.com/watch?v=yHJ_1IRzIWo]
Agora imagina a cena: a orquestra tocando essa mesma música enquanto passeia pelas ruas da cidade durante a noite de São João.
Imaginou?
Então, “desimagina” logo senão é você quem vai querer morar em Mucugê!
Mucugê também surpreende pela sua gente. É muito fácil se contagiar pela simplicidade e simpatia das pessoas que ali vivem porque, logo logo, você percebe que é algo absolutamente natural e desinteressado. Como me disse o Zé Pelo Mundo, dono de uma pousada em Mucugê (e sobre quem falarei em um post específico), ali não se tem grandes desigualdades sociais. Todos têm acesso a serviços públicos essenciais e experimentam boas oportunidades de renda e trabalho em função do turismo e também da agricultura, que é bastante desenvolvida. É isso o que torna Mucugê, segundo ele mesmo me disse, uma cidade bem democrática. E é isso o que, para mim, pode explicar essa simplicidade e simpatia contagiantes.
Simplicidade e simpatia que podem ser traduzidas em duas palavras: Dona Nena. Ela é a dona de um dos restaurantes mais conhecidos de Mucugê e encarna com perfeição as características daquela gente. Aliás, o Restaurante da Dona Nena só é restaurante mesmo no sentido amplo da palavra porque, na verdade, o que ela faz é abrir as portas e o fogão de sua casa para quem procura a boa e insuperável comida caseira, cobrando apenas R$22,00 pelo quilo.
É uma experiência única! Você atravessa a área social da casa da Dona Nena e vai até a cozinha dela se servir nas panelas que ficam em cima do fogão.
Tudo é cuidadosamente preparado por ela mesma. “As meninas me ajudam a preparar os ingredientes, mas quem bota a mão no fogão sou eu”, nos assegurou a Dona Nena após um longo e agradável bate-papo. “Isso é uma terapia para mim! Não me imagino fazendo outra coisa”, nos confessou ela com um brilho nos olhos tão sereno quanto incisivo.
Vai por mim: permita-se conhecer a comida e o papo da Dona Nena! Você vai sentir na pele que a experiência gastronômica envolve bem mais sensações que o simples paladar…
“Nossa! Tem tanta foto minha espalhada por esse mundo afora!”, retrucou a Dona Nena quando lhe pedi para tirar uma foto. Mas eu não poderia deixar de “trazer” a Dona Nena aqui para o “Rotas”.
Olha como ficou legal:
Eu poderia jurar que a música “Simplicidade” do Pato Fu foi escrita em Mucugê e para a Dona Nena!!!!
O almoço da Dona Nena foi o nosso primeiro contato com a comida típica da Chapada. Esqueça todos os pratos famosos que você costuma experimentar ao longo do litoral baiano. Não há nem sinal de moqueca (ou peixada, não é mesmo, capixabas?), acarajé, abará e vatapá! Ali a culinária é do tipo sertaneja, igualmente carregada no tempero, mas adaptada aos produtos do sertão: godó de banana verde, refogado de palma, mamão verde refogado e arroz tropeiro, para ficar só nos mais conhecidos. Você vai ter que rever seus conceitos gastronômicos para saborear tantos quitutes, digamos assim, exóticos.
E, como se não bastasse tudo isso, Mucugê também oferece boas e interessantes opções de passeio no seu entorno.
Em primeiro lugar, bem na entrada da cidade, o seu cemitério impressiona por sua incrível singularidade. Suas lápides reproduzem o estilo da arquitetura bizantina, lembrando pequenas igrejas góticas. Arcos e detalhes pontiagudos predominam no topo das sepulturas. E tal geometria aliada ao paredão de pedra sobre o qual se construiu o cemitério formam um conjunto visual único e de incomparável beleza.
Como já era de se esperar, me acabei de tanto tirar fotos.
Aliás, o cemitério bizantino foi uma das coisas que me fez voltar a Mucugê no final da viagem! Que a Renata não me leia, mas foi ele o verdadeiro motivo que me fez dar uma esticadinha no nosso trajeto antes de seguir até Rio de Contas. Nós não conseguimos visitá-lo durante a nossa estada em Mucugê, no início da viagem, por pura falta de planejamento. Ele era tão incrivelmente perto da cidade e tão facilmente acessível que sempre adiamos a visita para quando sobrasse um tempinho. A gente só não contava que esse tempo não sobraria nunca e que, quando nos déssemos conta, já teríamos partido para Lençóis sem conhecer o cemitério.
“Um pecado!”, pensei comigo. “Não posso voltar da Chapada sem conhecer o famoso cemitério de Mucugê!”. Era o motivo que eu precisava – se é que eu precisava de algum – para voltar à cidade antes de nossa última parada em Rio de Contas. Aproveitei que o caminho entre o Vale do Capão e Rio de Contas nos exigia passar bem perto da entrada de Mucugê para a esticadinha final. “É bom que a gente almoça por lá”, justifiquei-me maliciosamente para a Rê.
E não é que essa mudança de última hora acabou nos proporcionando uma experiência prá lá de agradável? E olha que eu não estou falando só do cemitério bizantino, que contribuiu muito para isso, claro! Estou falando do bate-papo que tivemos em pouco mais de 1 hora de contato com outra figura ilustre de Mucugê que conhecemos durante o nosso almoço.
Duvida? Pois pode perguntar pra Renata! Ela ficou tão ou mais encantada do que eu!
Mas segura a curiosidade um pouco e deixa pra perguntar para a Renata depois que eu publicar o post sobre isso porque eu não estou disposto a contar agora. Agora o que importa mesmo é Mucugê! Nem adianta insistir…
Voltando aos arredores da cidade, o Projeto Sempre-Viva também merece uma visita pela importância do trabalho que eles desenvolvem. Eles se dedicam a preservar e salvar do risco de extinção a espécie endêmica de sempre-viva que nasce no entorno de Mucugê, muito utilizada na fabricação de buquês. Seu nome se deve à longa duração da flor: mesmo após colhida, ela continua “viva” por muitos anos, reagindo ao ambiente externo. Só para se ter uma idéia, no museu da cidade de Mucugê, há um buquê todo feito com sempre-viva, que possui aproximadamente 50 anos!
Por conta disso, ela sempre despertou bastante interesse comercial e, desde a época do garimpo, vinha sendo extraída sem qualquer controle. A extração foi tão devastadora que a espécie de sempre-viva que nasce por ali – e que, como disse, é endêmica – entrou em risco de extinção. A bem da verdade, você quase não encontra a florzinha pelos arredores de Mucugê (eu, por exemplo, vi mais sempre-viva no Vale do Capão e nos arredores de Jussiape do que em Mucugê). Daí a importância do projeto.
Na sede do Projeto Sempre-Viva, que está localizada a 4 km do centro de Mucugê, você vai conhecer um pouco mais sobre a história da flor. Um monitor te acompanha durante a visita e mostra todo o trabalho que eles desenvolvem por lá. A taxa de R$10,00 por pessoa que se paga pela visita às instalações do Projeto também te dá direito a explorar os arredores e conhecer as cachoeiras da Piabinha (10 minutos de caminhada) e do Tiburtino (30 minutos de caminhada), seguindo por uma trilha bem demarcada e tranqüila. Essa última é bem caudalosa e impressiona quem ainda não se deixou levar pela imponência das quedas mais famosas.
No caminho das trilhas há ainda algumas ruínas de antigas casas de garimpeiro e objetos usados naquela época para você conhecer.
Mas, se você quiser se aprofundar mesmo na história do garimpo, a melhor opção é visitar o Museu do Garimpeiro que fica praticamente ao lado do Projeto Sempre-Viva, na mesma estrada que sai de Mucugê. Nós, contudo, não pudemos visitá-lo porque só tivemos disponibilidade para tanto na hora do almoço do nosso primeiro dia, coincidindo com o horário de fechamento do museu (12:00 as 14:00).
Com tantas atrações e recordações inesquecíveis de Mucugê, fala sério comigo: tenho ou não tenho bons motivos para querer morar lá?
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Estou adorando seguir a rota da chapada com vocês! Beijos
Que bom, prima! Fico lisonjeado por saber disso! Bjão na família!
Olá Thiago, achei interessante este seu site, realmente me deixou “Boqueaberto”…
Meus parentes por parte de pai são todos de Mucugê, e não conheço esta maravilhosa cidade, inclusive uma fto do cemitério tem na placa o nome de um Parente meu… Adorei seu site e vou virar seu fã, e assim que puder irei visitar essas maravilhas da Natureza que é a Chapada Diamantina….
Kleber, realmente tem muito “Medrado” em Mucugê. Eu, inclusive, conheci um “Medrado” em Minas, quando morava em Valadares. Por isso eu tirei a foto… rs
E sugiro que vc vá logo para Mucugê! A cidade é encantadora!
Que bom que está gostando dos relatos. Volte sempre!
Tiago, o primeiro post efetivo sobre a mais recente viagem de vcs deixou uma impressão de ter sido muito legal mesmo!!! Continua!!!
PS: Só a título de curiosidade, já que vc citou a música, no show de gravação do DVD do Pato Fu (Música de Brinquedo), eles tocaram Simplicidade. Mais um motivo para vc comprar o DVD quando sair…rs
Mais um motivo para comprar e IR ao show do Pato Fu, né Karol? Uma hora esse show tem que chegar aqui! rs
Pode deixar que o nosso relato vai continuar… rsrsrs
Muito bom Tiago,
É incrível como você consegue pegar esses “pontinhos” tão simples e transformar em algo tão especial. Acho que se eu fosse em um lugar assim, várias coisas me passariam despercebida.. mas lendo seu post dá MUITA vontade de conhecer…
Oi so p dizer que estou ‘grudada’ no seu blog acompanhando a rota de vcs pela chapada Diamantina, agora me de uma licencinha que tenho que ir ali ler o relato da Cachoeira do Buracao ta? 🙂
Estou adorando o seu relato tb!!!! Principalmente as fotos com pessoas
… rssrss…
Meninas, valeu pela visita!
Paulinha, sabe que, quando eu estava postando essas fotos minha e da Renata, eu lembrei de você? rsrs
Tá vendo? O “Rotas” também é um blog de gente! rs
Fiquei curiosa sobre a pousada!
Fernanda, vou falar sobre isso logo, logo!
Gostei do “quero morar em Mucugê”. É legal quando conversamos com pessoas que nasceram e criaram no local, passou pela decadência dos ciclos do diamante, da sempre viva e do café e agora o apogeu e possivelmente o turismo chegando devagar.
também faço parte da historia desse local e vendi alguns terrenos e casas no intuito de povoar nossa cidade, que chegou a ter menos de 300 habitantes, hoje 3.800 na sede.
Ailton, é sério! Eu realmente “quero morar em Mucugê“! rs
Sei que o tópico é antigo, mas é uma excelente visão dessa cidade tão acolhedora. Infelizmente muitos leigos ainda acham que a Bahia se resume em praia, sol e axé…
Taí a Chapada para provar, que pra quem tá disposto, que os encantos naturais são muito maiores e melhores!
Tem Bahia pra todos os gostos e estilos, Rê! 🙂
Tiago, estou na pegada de ir para Lençois no mes que vem, sem lenço e sem documento…vc acha que Mucugê é mais legal? Basicamente, vou ter que redescobrir minha pessoa já que sou da àrea de publicidade e do mercado financeiro… Penso mais em ir para servir de tradutor de inglês para turistas gringos mesmos, já que meu inglês é nativo… Na sua opinião? é mais barato de se viver em Mucugê? a possibilidade de uma vida mais leve tb? ET´s e Ovnis, à parte…? ;D obrigadão, abraço e até daqui um mês!!