A Igreja e a Lenda
Quem passa pela Avenida Jerônimo Monteiro, no Centro de Vitória, quase não percebe a presença ilustre de duas palmeiras imperiais que se erguem por entre muros de concreto bem do lado direito da pista. E se é difícil reparar no que se pode ver, que dirá daquilo que se encontra ao pé dessas árvores, praticamente engolida pelo cenário que se impôs ao seu redor?
A Igreja de Nossa Senhora do Rosário – essa aí que quase ninguém repara – é a última das igrejinhas antigas do centro de Vitória e também a mais distante delas. Ao contrário de todos os outros monumentos de que falamos, ela não está localizada no miolo da antiga Vila, naquela região que o capixaba atualmente conhece como “cidade alta”. Seu endereço é no Morro do Vigia, um elevado que margeia todo o início da Avenida Jerônimo Monteiro. Por isso o caminho até ela exige alguns minutos de caminhada: para quem está na Catedral, basta descer a Escadaria de São Diogo, atravessar a Praça Costa Pereira em direção ao Teatro Carlos Gomes, pegar a rua que passa por trás do Teatro até chegar à escadaria do Rosário, que dá acesso à Igreja.
A construção da Igreja foi iniciada em 1765 pela Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, utilizando mão de obra predominantemente escrava. Seus traços arquitetônicos originais, em estilo barroco, foram preservados. Seu interior é composto por nave, capela-mor, sacristia e um corredor com ossários de antigos integrantes da Irmandade. Ao todo, são quatro altares. O principal, em madeira, é de 1911 e abriga a imagem da padroeira. Não me pergunte, porém, a data e origem do lustre “modernoso” instalado bem no meio da Igreja. Esse aí é melhor ignorar…
Para os capixabas, a maior riqueza da Igreja do Rosário está em sua história, famosa pelo conflito envolvendo “Caramurus e Peróas”.
Na época da colônia, havia uma Irmandade devota de São Benedito que se reunia no Convento de São Francisco e saía em procissão, com a imagem do santo, todos os anos. No ano de 1832, entretanto, como chovia muito na cidade, o pároco do Convento não permitiu que a procissão saísse com a imagem do local, causando profunda revolta nos fiéis. Uma parte dos integrantes da Irmandade de São Benedito foi expulsa do Convento e encontrou abrigo do outro lado da cidade, na Igreja do Rosário, onde os negros – que se identificavam com o santo de pele escura – também prestavam devoção àquele santo. A partir daí, criou-se uma grande rivalidade entre as duas comunidades, que eclodiu com o roubo da imagem de São Benedito pela Irmandade do Rosário no ano seguinte.
Os irmãos do Convento de São Francisco foram logo apelidados de “Caramurus” em alusão ao perfil traçoeiro do peixe e sua cor verde (a mesma que predominava em suas vestes). Em revide, os do Rosário foram, então, comparados a um peixe de baixa qualidade que era desprezado pelos pescadores: o “Peroá”. Em meio a tanta rivalidade, “Caramurus e Peroás” protagonizariam durante anos um espetáculo de sons e cores pelas ruas da cidade na disputa pela preferência de São Benedito em suas procissões.
Um pequeno museu dentro da Igreja conta parte dessa história, exibindo peças usadas nas procissões. A imagem de São Benedito que foi “roubada” do Convento de São Francisco está até hoje sob a guarda da Irmandade do Rosário – a única que sobreviveu ao folclore.
Parabéns pelas fotos, Tiago!
Lembro-me de quando a gente falava de como seria difícil tirá-las… Parabéns!!!
Valeu, Patrik!
Vê se não some, hein?
A história Peroás e Caramurus é muito interessante, mas o texto acima apresenta alguns equívocos como: o “roubo” da imagem não foi realizado pela irmandade do Rosário e sim por membros dissidentes da Irmandade de São Benedito que se reunia no Convento de S.Francisco. Após o roubo se formou uma guarda de honra para a imagem, que foi levada do convento para a Igreja do Rosário. A guarda de honra se transformou na Irmandade de São Benedito do Rosário, para onde os irmão da irmandade do Rosário acabaram migrando, e se constitui hoje a guardiã da imagem da igreja e que realiza a todo 27 de dezembro os festejos de São Benedito.
Fonte de Consulta:
Biografia de uma Ilha de Serafim Derenzi; Velhos Templos e outros temas capixabas de Elmo Elton e Aconteceu em Vitória .